segunda-feira, 12 de novembro de 2018

100 anos depois que os EUA se envolveram na Primeira Guerra Mundial. É hora de saber porque - Por Robert E. Hannigan


Robert E. Hannigan


            Muito do que a mídia noticie é provável de ocorrer nesta primavera pelo fato que cem anos atrás os EUA declararam guerra à Alemanha, iniciando pela primeira vez a participação americana num conflito militar em solo europeu. A natureza sem precedentes desta “grande partida” será comentada. Mas é improvável que muitos observadores se aventurarão além do que por muito tempo tenha sido a explicação padrão deste envolvimento. Uma oportunidade para uma clara compreensão da emergência dos EUA como um poder mundial no século XX irá assim ser sentida ausente. 

            Nos é usualmente dito que o envolvimento do governo dos EUA na Grande Guerra pode ser explicado de modo muito simples. Talvez não surpreendentemente o relato prevalecente se encaixa numa narrativa vastamente aceita e promovida no exterior sobre o papel geral dos EUA no mundo moderno. Os males externos são a raiz da questão, e eles exigem que a “nação indispensável” faça o mundo seguro, livre e democrático. Em 1917, a Alemanha, por seu uso agressivo de submarinos para bloquear a Grã-Bretanha e seus aliados, forçou o EUA a abandonar a neutralidade. Um presidente idealista, Woodrow Wilson, respondeu aos comícios americanos por trás de uma cruzada pretendendo não somente punir Berlim, mas salvar o mundo de ter que suportar a guerra novamente.

            Mas esta explicação é grosseiramente inadequada. Para compreender o que ocorreu, ajuda ter em mente que os líderes americanos tinham vindo, cerca de 1900, bem antes da guerra irromper na Europa em 1914, a manter decididas visões sobre o futuro do papel da nação deles no mundo. Inspirados especialmente pelo estupendo crescimento econômico que a América estava experimentando, eles acreditavam que a nas décadas que estavam chegando os EUA poderiam ascender a uma posição de importância internacional comparável, se não eclipsando, àquela desempenhada pela Grã-Bretanha no século XIX. Ao mesmo tempo eles acreditavam que a continuação do tipo de ordem internacional que Londres tinha presidido era vital para o sucesso deles. Eles estavam alarmados pela grande intensificação de potências rivais que poderiam ameaçar aquela ordem e estavam especialmente ansiosos sobre as mudanças das fronteiras políticas e estruturas comerciais que prevaleciam através da América Latina e do leste da Ásia. Era acreditado que ambas daquelas vastas regiões subdesenvolvidas veriam a ascensão da influência e do comércio dos EUA. A partir desta preocupação, surgiram as duas marcantes políticas externas da América neste período: a (revitalizada) Doutrina Monroe e a Política da Porta Aberta.

            Grandes relações de poder cada vez mais pareciam requerer atenção também. Enquanto a Grã-Bretanha era considerada como uma rival, muitos de suas políticas foram vistas como trabalhando para a vantagem dos EUA. Como um resultado, os dois governos se aproximaram. E Washington também começou trabalhar com Londres para promover mecanismos para a resolução de disputas internacionais, sendo a guerra vista como uma ameaça ao status quo.

            Do começo ao fim, a resposta oficial dos EUA à Grande Guerra foi dominada pelo objetivo de tentar restaurar e então colocar uma mais segura fundação ao tipo de ordem internacional que os fazedores da política americana queriam. Ideologicamente, eles asseguraram eles mesmos que isto seria uma busca no interesse não somente de todos americanos, mas do mundo inteiro. Os mais altruístas e responsáveis estadistas do mundo estavam simplesmente trabalhando para assegurar que o mundo fosse montado na maneira que era suposta ser, (no pensamento racialista deles) com os povos mais adultos e civilizados da humanidade (eles próprios) liderando o resto em direção ao progresso.
  
            O envolvimento americano na Grande Guerra começou, no exato momento em 1914 quando a guerra estourou. A administração de Wilson queria o conflito composto, mas o presidente e seu conselheiro chefe, o coronel. Edward M. House {membro dos bastidores da política com mais poderes que o próprio presidente}, a paz não era um fim em si mesmo. Era uma matéria muito importante que a Alemanha não minasse a Grã-Bretanha e que fosse ensinada a ela uma lição. Foi também vital que a resolução assegurasse contra outro tipo de levante. Frente a estes fins, os EUA promoveram eles mesmos como o único mediador adequado do conflito e tentou posicionar-se ele próprio num lugar na mesa da paz. Antes mesmo de a guerra começar a administração tinha já proposto um plano rústico para a estabilização.  A peça central do plano envolveu os EUA e grandes potências que chegaram juntas para manter o status quo contra potenciais adversários como a Rússia e o Japão, bem como supervisionar o futuro do que o coronel House chamou de “lugares perdidos” da terra, o mundo subdesenvolvido. Este plano foi, de fato, um dos precursores da Liga das Nações de Wilson.

            Quando a guerra começou Wilson declarou que os Estados Unidos seguiriam uma trilha neutra, e era certamente sua preferência ficar fora da luta. Mas no fim seu apego a uma particular visão do papel da América no mundo do século vinte importava mais que a paz.  Seja lá o que ele disse em público, ele repetidamente inclinou-se frente a Grã-Bretanha e seus aliados, não somente por causa que ele não queria que eles perdessem, mas também porque ele queria fazer garantido que os EUA teria um papel de liderança (junto com a Grã-Bretanha) no arranjo do mundo do pós-guerra. Assim, ele concordou com as medidas marítimas indiscriminadas da Grã-Bretanha, as quais envolviam o uso de sua marinha e minas para destruir todo o comércio da Alemanha. E House secretamente ofereceu-se para coordenar seus esforços de paz com Londres. As mesmas considerações foram chave para muito da postura diferente que Wilson assumiu frente ao uso da Alemanha de submarinos. O presidente ameaçou a guerra a não ser que Berlim aderisse a suas visões sobre como se poderia portar em alto mar.

            Wilson continuou tentando conseguir os dois lados a aceitarem sua visão de uma resolução adequada. Mas ambos continuaram não cooperativos. Sua esperança da América tornar-se um poder mundial sem participação na luta da Grande Guerra até aqui na verdade foi feita refém da questão de por quanto tempo Berlim concordaria em respeitar as linhas vermelhas de Wilson. Esta questão seria respondida em 1917, apenas meses após ele ter sido reeleito como presidente por trás do slogan “Ele nos manteve fora da guerra.”

Tradução e palavras entre chaves por Mykel Alexander




Sobre o autor: O professor Robert E. Hannigan (Suffolk University, Boston, Departamento de História) tem interesse, em mais de quatro décadas de carreira, principalmente na história moderna americana e na intersecção entre os EUA e a história do mundo. Ele tem participado de múltiplas conferências e seminários nos EUA e exterior, escrito resenhas e artigos para jornais como o American Historical Review e o Diplomatic History. Entre suas principais obras constam The New World Power:  American Foreign Policy, 1898-1917 (University of Pennsylvania Press, 2002) e The Great War and American Foreign Policy, 1914-1924 (University of Pennsylvania Press, 2016). Ele possui bacharel pela Cornell University, Mestrado na Princeton University e PhD na Princeton University.


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2 comentários:

  1. Nessa época, nações como Russia, Japão, Itália, Alemanha entre mais alguns.. poderíamos dizer que foram nações que se mantinham um certo nível de tradição? e essa tradição atrapalharia a intenção de desenvolvimento globalista mordenista que o Presidente Wilson tinha p os EUA e o mundo?

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    1. Vamos então entender como a tradição as grandes concepções arcaicas pré advento das religiões abraâmicas (judaísmo, cristianismo e islamismo). Tais legítimas tradições seriam as egípcia, babilônica, hindu, chinesa, asteca, maia, inca, grega, romana, germânica entre as principais.

      A ruptura ocorreu com o advento das religiões abraâmicas (judaísmo, cristianismo e islamismo) e com as derivações do Iluminismo e da emancipação judaica pós-Revolução Francesa. Nesse caso somente o Japão mantinha pouca contaminação, embora tinha assimilado traços de mentalidade iluminista em alguns de seus setores dirigentes no século XIX.

      Vamos ver agora o perfil predominante de mentalidade em cada uma das nações europeias mencionadas por você:

      Rússia: tinha rejeitado o liberalismo, não tinha proletário, era semi-feudal, mentalidade rural e guerreira desapegada da vida, cristianismo ortodoxo e tradições variadas devido a ocupar dois continentes, encontrando-se desde xamanismo até budismo. País rústico e tradicional. O judaísmo tinha liberdade religiosa, mas restrições totais em se aventurar legalmente na política, publicidade e economia da nação (daí o ódio dos judeus/bolcheviques/comunistas contra os russos, e o banho de sangue que foi a chamada "Revolução Russa" judaico/bolchevique/comunista).

      Itália: vinha de um período no século XIX de unificação de seus Estados, uma certa resistência contra a autoridade cristã (daí uma das grandes polêmicas da época, a da educação caber a Igreja ou ao Estado) ao mesmo tempo que mantinha respeito pelo cristianismo. Surgimento de nostalgia dos tempos de glória do Império Romano.

      Alemanha: Auge, zênite do mundo, conjugava investigação científica no mais alto nível em todas as áreas, mentalidade não materialista, imparcialidade em busca pela verdade através da filosofia, identidade com suas tradições arianas (haja visto sua vanguarda nos estudos indo-europeus) bem como respeito pelas tradições arcaicas (especialmente do Extremo Oriente), genialidade nas artes com Wagner ainda recém falecido, mentalidade trabalhadora, marcial e sensível ao mesmo tempo. Tudo oposto ao fanatismo abraâmico.

      Com certeza estas quatro nações estavam na contra-mão do materialismo e da globalização que eram representadas nas palavras vazias de Wilson (mero fantoche de Bernard Baruch e coronel House) lançadas aos quatro ventos.

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